quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Sarilhos mil, conhecimento zero

Confesso que ao ler aqui as declarações do Cardeal Patriarca de Lisboa fiquei mais tranquilo. Logo de manhã quase que dei um salto no carro ao ouvir na TSF alguns trechos da intervenção de D José Policarpo que, grosso modo, se constituíam num conselho e numa informação.

A informação era a de que o diálogo com a comunidade muçulmana em Portugal é muito difícil, o conselho destinava-se a todas as "jovens europeias de formação cristã" que desejassem casar-se com um muçulmano. Que pensassem duas vezes antes de darem esse passo!, pois, de acordo com o Cardeal Patriarca, iriam meter-se em “montes de sarilhos”.

Não sou muçulmano, é bom que se diga. Nem tão-pouco tenho uma empatia natural por esta religião. Mas devo dizer que fiquei desconfortável ao ouvir aquelas declarações. Não tanto pela informação (mas afinal de contas, bem vistas as coisas, o que é que querem tanto dialogar?!! ver quem é que tem razão??) mas pelo conselho.

Não que o conselho seja desprovido de razão, especialmente se visto aos olhos de um ocidental. O papel subalterno da mulher em parte do mundo muçulmano está mais do que documentado. Lembro-me, só para citar um exemplo, de uma reportagem da RTP no Kosovo, onde tentaram falar com uma portuguesa que se tinha casado com um muçulmano. Para falar, tinha de pedir autorização ao marido, e como ele não estava, era o cunhado que teria de dar a autorização. Como ele não autorizava a conversa, a mulher, essa jovem cristã que tinha conhecido o marido em Paris, não falou...

Não. Não é por isso. É pela ideia de que as jovens europeias de formação cristã precisam de conselhos deste tipo. Não saberão, por acaso elas, no que se estão a meter? É que, repito, a situação da mulher em partes do mundo muçulmano está mais do que documentada... Mais. Como acho que nenhuma delas se casa sem conhecerem e se converterem à fé muçulmana...

E por me ter lembrado na questão da conversão lembrei-me de outra coisa. Não terão as declarações do Cardeal Patriarca de ser analisadas à luz de quem defende o seu rebanho? Parece-me que sim. Mas após ler as declarações do Cardeal Patriarca fiquei, como digo acima, mais tranquilo. Para mim, o mais importante delas até não foi o conselho nem a informação. O mais importante foi D José Policarpo ter dito que “somos muito ignorantes” em relação à religião muçulmana. Concordo. Afinal de contas, se exceptuarmos, talvez, o Pacheco Pereira, quem é que se deu ao trabalho de tentar ler e perceber o Alcorão?

A ignorância, colocada desta forma, deve ser combatida para existir um melhor e menos ingénuo entendimento entre religiões. Mas parece-me, muito sinceramente, que as jovens cristãs europeias não necessitam de conselhos sobre os sarilhos que irão arranjar se se casarem com um muçulmano. Acho, muito sinceramente, que a ignorância não é para aqui chamada. É uma questão pessoal. Claro que existirão casos dramáticos, mas deveremos tomá-los como certezas em todos os relacionamentos entre cristãos e muçulmanos? Sinceramente não sei se sim.

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