sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Rate me, darling!

Durante os últimos dias tem-se falado muito sobre as ameaças que a Standard & Poor’s, campeão das sociedades de rating, fez a vários países no sentido de rebaixar a sua qualificação, entre eles Espanha e Portugal.

Como todo economista cabal e minimamente competente sabe, os ratings são elementos capitais na formação da dívida dos Estados e das empresas, dado que proporcionam a potenciais investidores e devedores uma imagem da fiabilidade da entidade. Quanto melhor é o rating, menores são a indefinição e o risco associados às operações financeiras desse agente económico e menores as cargas financeiras que o agente deve suportar a câmbio do dinheiro dos investidores.

So far, so good. Até podemos concordar todos que é uma boa ideia que entidades independentes como a Standard & Poor’s assumam esse papel de “salvaguarda sistémica” contra operações e produtos financeiros de alto risco e dúbia qualidade.

O problema é que as ditas agências não são independentes a séria. O seu protagonismo nesta crise mundial que estamos a viver é central, dado que os produtos financeiros que contaminaram os mercados nem teriam chegado a ser negociados se a avaliação de risco dos mesmos tivesse sido feita de maneira responsável e independente. Não podemos esquecer que as agências de rating são contratadas pelos bancos para avaliar os seus produtos. E sendo o negócio das agências receber dinheiro pelas ditas avaliações, pareceria estúpido a qualquer responsável pelos negócios de qualquer uma destas agências “incomodar” aos seus clientes fornecendo avaliações pouco simpáticas do risco associado a certos produtos. Desde a perspectiva dos bancos, obviamente que nenhuma agência que “subavaliasse” os seus produtos uma vez, voltaria a ser contratada!

O resultado é evidente: quanto melhores são as avaliações, maior o volume de negócio das agências avaliadoras e das próprias entidade emitentes, pois os produtos aparecem no mercado com um carimbo de confiança. E na situação inversa, a da crise, a da contracção dos mercados? Pois, voltando ao início do meu comentário, estamos a viver isso agora: todos os agentes são pouco prestáveis, os seus produtos manhosos, as perspectivas gerais são más, a desconfiança é o clima dominante e as agências avaliadoras não podem confiar em ninguém, porque o seu prestígio (???) poderia ficar em perigo. E então é que aumentam as cargas financeiras, a dívida, o défice...

Resultado evidente: o comportamento pro-cíclico das agências de rating, que tem efeitos muito negativos tanto no auge como na crise.

E afinal isto é um problema de independência, não de competência, pois não me parece que os profissionais das agências de rating sejam incompetentes. Parece-me sim que os objectivos corporativos não são compatíveis com o seu papel teórico: avaliar o verdadeiro risco dos produtos e agentes financeiros independentemente da sua procedência e estado de ânimo dos mercados. Em definitiva, um papel nivelador e até certo ponto contra-cíclico.

Corolário: vou arriscar a ser chamado de “commie”, mas não será necessário (re)pensar o papel deste tipo de agente económico? Não será aqui também necessário um “novo paradigma”? Será que o assunto se encontra nas agendas destas conferências internacionais (G20 e afins) sobre economia global? Se calhar até era boa ideia…

2 comentários:

GreenFlag disse...

Puseste o dedo numa das feridas desta crise. Outra são as empresas auditoras. A lógica é exactamente a mesma. Elas são contratadas não para auditar as contas de forma independente, mas para validar as contas. E caso, levantem questões, podem perder a conta desse cliente que procurará outra empresa que lhe faça o frete. Temos aqui dois bons exemplos da chamada independência e auto-regulação dos mercados.

Olho de Vidro disse...

Bem dito, RightWing. E o caso paradigmático foi o da Enron, aonde tudo esteve na maior até o próprio dia do colapso! Pelo menos neste caso a Arthur Andersen pagou um preço... O problema, volto a dizer, é a divergência entre os objectivos corporativos e o papel teórico deste tipo de agentes no mercado. Parece evidente que independência e autorregulação são objectivos de difícil compatibilidade com a maximização de lucros...